Chefe da PGJ (Procuradoria Geral de Justiça), o promotor José Antônio Borges apresentou denúncia criminal ao TJMT (Tribunal de Justiça de Mato Grosso) contra sua colega de MPE (Ministério Público Estadual), promotora Solange Linhares Barbosa, o fotógrafo Jean da Rosa Nunes e o administrador Wellington Miranda Passos por supostos desvios de até R$ 985,785 mil utilizando-se de falsos projetos de bem estar da população indígena do Xingu, no ano de 2017, tempo em que servia na Promotoria de Paranatinga (distante 375 quilômetros de Cuiabá).
De acordo com o procurador-geral de Justiça, a promotora Linhares Barbosa primeiro fundou os Institutos Homem Brasileiro e Wanaki, pelos quais “fingia executar” projetos como Águas do Xingu e Cidadania Xingu, e neles implementou 13 TACs (Termos de Ajustamento de Conduta) para justificar os supostos desvios de valores, utilizando-se de empresas apoiadoras. Outro meio usado, acusa o procurador-geral de justiça, seria o Conseg (Conselho de Segurança Pública) do município.
No TJMT, o “procedimento investigatório criminal” é endereçado diretamente ao presidente do Órgão Especial do TJMT, desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha. O fundamento para acusar a aludida improbidade seriam investigações feitas pelo NACO (Núcleo de Ações de Competência Originária Criminal). Agora, a denúncia pode ser aceita ou rejeitada pelo colegiado.
“Consta dos autos do incluso Procedimento Investigatório Criminal que, no ano de 2017, no Município de Paranatinga/MT, Solange Linhares Barbosa, na condição de Promotora de Justiça, desviou, em proveito próprio e alheio, sempre com o propósito de satisfazer seus interesses pessoais, o valor aproximado de R$ 985.785,75, oriundo de 13 Termos de Ajustamento de Conduta firmados por ela, como representante do Ministério Público Estadual, em procedimentos que tramitavam na Promotoria de Justiça de Paranatinga/MT, onde ela era titular. (…)[Valores] oriundos de TACs a serem disponibilizados pelos compromissários e que se destinariam à execução dos mais variados projetos, supostamente do interesse do Ministério Público do Estado de Mato Grosso e que, entretanto, jamais existiram formal ou concretamente”, escreveu o procurador-geral de justiça.
Conforme o texto da denúncia, os comparsas contribuíram de maneira evidente e decisiva para os supostos desvios e isso fora confirmado por depoimentos prestados pela presidente do Instituto Homem Brasileiro, Veviane Cristina Ferreira, e pela contadora da mesma entidade, Jovanka Melvi Mercado Bravo Rodrigues, colhidos durante um PAD (Processo Administrativo Disciplinar) instaurado antes da formalização da denúncia e que a balizou. “Os outros denunciados (Jean e Wellington), cada um ao seu tempo e da sua forma, sempre previamente ajustados com a agente ministerial, concorreram, decididamente, para com a efetivação dos desvios e, inclusive, se apropriaram e se beneficiaram dos recursos desviados”.
Para o procurador-geral, Solange cooptava as empresas a depositar valores para o Instituto Homem Brasileiro, Instituto Wanaki e o Conseg sob a justificativa de execução do Águas do Xingu, que foi criado para preservação e proteção ambiental, mas sem conhecimento da diretoria do primeiro instituto e sem nunca o executar. “Tratou-se, tão somente, de uma fantasia criada por Solange Linhares Barbosa para tentar justificar o aporte de recursos dos TACs para aquelas entidades e, a partir daí, utilizá-los, em proveito próprio e/ou alheio, sempre conforme seus interesses e das mais variadas formas”.
Os dinheiros teriam sido desviados em três ocasiões e TACs até o montante de R$ 726 mil, repassados diretamente ao Instituto Homem Brasileiro, dos quais R$ 203,6 mil serviriam ao Projeto Águas do Xingu, e a outra parte, R$ 446,6 mil, iriam a outro projeto, o Cidadão ou Cidadania Xingu. Segundo o procurador geral, mera “invenção da cabeça” da promotora.
Os outros R$ 160 mil foram desviados — sempre segundo a acusação de Borges — para que o Conseg construísse um prédio para abrigar duas instituições: um tal Memorial do Xingu e a Casa de Artes do Xingu, em obras que deveriam ser fiscalizadas pelo outro instituto, o Wanaki Povos da Floresta, uma ONG que ainda seria criada.
Textualmente, o procurador geral chamou de "fantasia da cabeça da promotora" os projetos pretensamente não tocados por ela no Xingu por meio de ONGs e projetos que sequer existem, como projetos ambientais, escola sonhada e Casa do Papai Noel, além dos já citados.
Solange Linhares Barbosa conseguiu manter o cargo frente a seus pares, pois ela foi julgada na segunda-feira (3) pelo Conselho Superior do Ministério Público e recebeu uma pena de suspensão por 30 dias, apesar de a acusação ter pedido pela demissão. Eram necessários seis votos pela perda do cargo; ela recebeu quatro.
NOTA/OUTRO LADO
A promotora acusada disse, por meio de nota, que recebeu com tranquilidade tanto o resultado do julgamento quanto as acusações entregues ao TJMT.
Leia a íntegra:
“Atuei por bastante tempo na defesa de direitos indígenas e sempre soube que poderia sofrer algum tipo de questionamento por isso. Todos podem ser investigados e acionados pelo Ministério Público e eu não sou melhor que ninguém, mesmo sendo uma membra do órgão. Não me arrependo de nenhuma das ações e projetos executados pela minha promotoria junto às comunidades indígenas do Alto Xingu, Bakairi e Xavante, que fazem parte da minha antiga comarca (Paranatinga), e provarei que não incorri em falta funcional ou crime e sim executei o meu mister constitucional com afinco”.